sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

domingo, 15 de janeiro de 2017

ARTIGO - Responsabilidade civil do empregador pela ausência de registro do contrato de trabalho

Evandro de Oliveira Tinti (*)

INTRODUÇÃO


Mesmo com o advento da Constituição Federal de 1988, que positivou inúmeros direitos humanos como direitos fundamentais, bem como, especificamente, diversos direitos sociais, é visível atualmente que ainda há uma grande distância entre o texto constitucional e sua aplicação efetiva.
Inúmeros direitos são desrespeitados, diversas vezes até pelo Poder Público, mas principalmente por alguns empresários que, buscando lucro a qualquer preço, desvalorizam a atividade realizada pelo trabalhador, sem se dar conta da importância deste último para a cadeia produtiva do sistema capitalista, que vai desde o início da produção até o consequente lucro.
E partindo desta premissa, estes empresários acabam por não registrar e anotar devidamente o contrato de trabalho do empregado em sua Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS), o que resulta o pagamento somente do salário, sem outros direitos provenientes da formalização do contrato, tais como contribuições sociais, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, Seguro de Acidente de Trabalho, Seguro-Desemprego, PIS, dentre outros, o que poderia causar diversos transtornos ao empregado, que fica impedido de usufruir a plenitude de seus direitos.
Do mesmo modo, além da supressão de diversos direitos do empregado, também é possível cogitar-se a possibilidade da ocorrência de um dano moral ao trabalhador, causado pela ausência do registro na CTPS, o que justifica este estudo aprofundado da responsabilidade civil do empregador nesta situação, a partir do método dedutivo, com análise de doutrinas e jurisprudências que guardem relação com o tema.
Assim, a presente pesquisa tem por escopo averiguar a possibilidade da condenação do empregador em indenizar o empregado pelo dano moral causado com a ausência de registro em sua CTPS, bem como discorrer sobre os efeitos que a repreensão desta prática pelo Poder Público poderia trazer à sociedade, primeiro pelo aumento da arrecadação de impostos sonegados a partir da informalidade, também pela reparação dos danos causados aos empregados, mas, principalmente, pela efetivação e direitos fundamentais e sociais do trabalhador.


1 O DANO MORAL NA RELAÇÃO DE EMPREGO


A Constituição Federal de 1988 instituiu alguns princípios e garantias fundamentais sobre a reparação de danos. Em seu artigo 5°, inciso X, está expresso que: “São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”
O novo Código Civil, lastreado pela linha principiológica constitucional, apresentou grandes avanços no que tange à indenização decorrente de ato ilícito. O artigo 186 prescreve: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Em conseguinte, o artigo 927 garante ao lesado a reparação do dano, dispondo: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.
Assim, nota-se que o ordenamento jurídico brasileiro garante a todo aquele que sofrer dano, seja moral ou material, a devida reparação, o que também serve de desmotivador de repetição de condutas e punição do agente ofensor.
É este o entendimento que prevalece na doutrina e na jurisprudência:

O dano moral tem um duplo caráter: compensatório para a vítima e punitivo para o ofensor. Ao mesmo tempo em que serve de lenitivo, de consolo, de uma espécie de compensação para atenuação do sofrimento havido, atua como sanção ao lesante, como fator de desestímulo, a fim de que não volte a praticar atos lesivos à personalidade de outrem. [1]

Deste trecho infere-se que, muito embora seja difícil especificar a intensidade da dor psicológica sofrida, é necessária ao menos uma atenuação do sofrimento da vítima do dano moral, não sendo menos importante o caráter repreensivo da indenização, o que servirá de exemplo ao causador do dano e aos demais membros da sociedade, para que se abstenham de realizar certas condutas potencialmente ofensivas.
E na relação de emprego é perfeitamente possível a aplicação de dispositivos do Direito Civil, tendo em vista o caráter contratual que está presente no vínculo entre empregado e empregador, inclusive o instituto do dano moral, quando o dano for oriundo da relação de emprego, além de estarem presentes os elementos fático-jurídicos para caracterização do dano moral.
A doutrina é pacífica ao tratar do assunto. Carlos Roberto Gonçalves demonstra que: “O empregador responde pela indenização do dano moral causado ao empregado, porquanto a honra e a imagem de qualquer pessoa são invioláveis (Art. 5°, X, CF).” [2]
É indiscutível ainda que a competência para julgamento de questões relativas ao tema é da Justiça do Trabalho, conforme sedimentado na Súmula 392, que dispõe: “Nos termos do art. 114 da CF/1988, a Justiça do Trabalho é competente para dirimir controvérsias referentes à indenização por dano moral, quando decorrente da relação de trabalho.”
Assim, é pacífico o entendimento doutrinário e jurisprudencial que garante a possibilidade da indenização por dano moral decorrente da relação de emprego, cujo pleito deverá ser analisado pela Justiça do Trabalho.


2 DO DEVER DO EMPREGADOR DE REGISTRAR A CARTEIRA DE TRABALHO E PREVIDÊNCIA SOCIAL


A Consolidação das Leis do Trabalho traz em seu bojo proteção especial à CTPS, em seus artigos 13 a 56, tendo em vista a importância deste documento para o empregado e para o contrato de trabalho.
A CLT garante, em seu artigo 29, que é obrigatório o registro do contrato de trabalho pelo empregador logo que admitir o empregado, no prazo de 48 horas, devendo nela anotar a data da admissão, a remuneração, e eventuais condições especiais do contrato de trabalho, como nas hipóteses de contrato a termo, dentre outras situações excepcionais ou relevantes à relação jurídica ali formalizada.
Na ausência de alguma destas formalidades, a própria CLT, em seu artigo 36 e seguintes, garante ao empregado, individualmente ou por seu sindicato, a possibilidade de reclamação perante o Ministério do Trabalho e Emprego para obrigar o empregador a cumprir a legislação.
Todavia, tal instrumento é pouco utilizado pelos sindicatos e muito menos pelos empregados. Talvez pela ausência de conhecimento desta possibilidade, mas principalmente pela condição de hipossuficiência que o empregado se encontra perante o empregador, que lhe retira a segurança de se insurgir contra a empresa durante o vínculo de emprego.
Importante observar, ainda, que é prevista punição administrativa, no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego, que deve impor ao empregador que não efetuar o registro do empregado a multa de meio salário mínimo, para cada um deles, nos termos do artigo 47 da CLT.
E, do mesmo modo, prevê a CLT, no artigo §4°, do artigo 29, que: “É vedado ao empregador efetuar anotações desabonadoras à conduta do empregado em sua Carteira de Trabalho e Previdência Social.”, cujo descumprimento é passível de multa equivalente à metade do valor do salário mínimo regional, nos termos do §5° deste mesmo dispositivo legal e do artigo 52 da CLT.
Neste mesmo sentido, observando a importância da formalização do contrato de trabalho, e na tentativa de desmotivar estas condutas por partes de empregadores, o artigo 297 do Código Penal, garante de que a ausência de registro de empregados configura-se como crime, punível com pena de dois a seis anos de reclusão, além de multa.
Nota-se, a partir destas disposições legais, o quanto a CTPS é importante ao empregado, e para a sociedade, uma vez que é por meio dela que se formaliza o contrato de trabalho para todos os fins de direito, sendo a identidade da pessoa como empregado, além de representar a dignidade do trabalhador, que se insere como participante ativo da sociedade.
Deste modo, a legislação trabalhista defende a efetivação dos direitos fundamentais e sociais dos trabalhadores, inclusive a dignidade humana e o valor social do trabalho, que são fundamentos da república previstos nos incisos III e IV, respectivamente, do artigo 1° da Constituição Federal, sendo uma das formas desta efetividade o registro do contrato de trabalho na CTPS do trabalhador.


3 CONSEQUÊNCIAS DA AUSÊNCIA DE REGISTRO DO CONTRATO DE TRABALHO NA CTPS


Não havendo registro do contrato de trabalho, mesmo com a efetiva prestação de serviços enquadrada nos elementos fático-jurídicos da relação de emprego (trabalho subordinado, prestado pessoalmente, por pessoa física, de maneira não eventual e mediante remuneração) o empregado passa a sofrer diversas ofensas a seus direitos básicos, conforme explanado oportunamente.
Mesmo diante destas situações, durante o contrato de trabalho, o empregado termina por não encontrar meios para se insurgir diretamente contra o empregador, para pedir o registro de seu contrato, diante da sua posição de hipossuficiência, que não é somente econômica, mas é também social.
Vê-se, por isso, que uma saída do trabalhador seria a propositura de Reclamação Trabalhista, normalmente após o encerramento do vínculo de emprego, para pleitear o que deveria ter sido realizado no início da prestação laboral, há meses, ou até anos atrás: o registro do contrato de trabalho e os direitos dele decorrentes, como contribuições previdenciárias e FGTS em atraso.
Porém, há sempre o risco de não conseguir se corrigir judicialmente a situação de forma plena. Primeiro pela ausência de provas contundentes e aptas a comprovar o vínculo de emprego, o que resulta muitas vezes na impossibilidade de se reconhecer um vínculo que realmente existiu, mas também pelos danos que a ausência de registro ocasionou ao empregado, pois o registro é retroativo, mas a proteção previdenciária, os benefícios do sistema financeiro e habitacional exclusivos para quem prova estar empregado, dentre outros direitos oriundos do registro, não voltam no tempo.
Há também possibilidade expressa de se pleitear a intervenção do Ministério do Trabalho e Emprego por iniciativa do trabalhador ou do sindicato, que além de multar a empresa, também pode determinar o registro da CTPS do empregado.
Claro que, na prática, ambas as hipóteses elencadas acima não encontram efetividade plena, por conta das peculiaridades da relação jurídica entre empregado e empregador, que naturalmente se mostra desigual e desproporcional em diversos fatores.
Por isso, uma possibilidade ao alcance do empregado seria a rescisão indireta do contrato de trabalho, uma vez que, havendo descumprimento contratual por parte do empregador, emergiria a hipótese prevista no artigo 483, “d” da CLT, que dispõe:

Art. 483 - O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:
(...)
d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;
(...)

Entretanto, esta também é uma hipótese que nem sempre se adequa à realidade do trabalhador, pois como este necessita do emprego, muitas vezes sofre calado os efeitos da ausência do registro em sua CTPS.
Deste modo, deve se buscar outros meios jurídicos para se buscar a efetividade do direito do empregado ao devido registro em CTPS e todos os direitos decorrentes da formalização do contrato de emprego.
Assim, além da imposição do registro do contrato de trabalho na CTPS do trabalhador pelo Ministério do Trabalho e Emprego e do reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho pela via judicial, outra possível consequência jurídica advinda desta situação seria a indenização por danos morais por ele sofridos, conforme será tratado de forma mais profunda no tópico subsequente.


4 DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR PELA AUSÊNCIA DE REGISTRO DO CONTRATO DE TRABALHO


Basicamente, há duas correntes jurisprudenciais quanto à possibilidade de indenização pelo dano moral, na hipótese de ausência de registro do empregado.
A primeira defende que é devida referida indenização apenas se ficar comprovado o dano ao trabalhador, a conduta culposa do empregador e o nexo causal entre ambos.
Nesse sentido:
"RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE REGISTRO DO CONTRATO DE TRABALHO NA CTPS. Para que se configure ato ilícito a justificar a reparação de ordem moral, é necessário que a conduta do empregador acarrete efetivo prejuízo imaterial ao trabalhador, direto ou indireto, o que não ocorre na espécie. A recusa de anotação do contrato de emprego na CTPS, quando se controvertem em Juízo as hipóteses de empregado ou de trabalhador autônomo, não enseja o denominado -damnun in re ipsa-. Precedentes. Recurso de revista parcialmente conhecido e provido." (TST. RR - 171900-70.2004.5.02.0021, 1ª Turma, Relator: Walmir Oliveira da Costa, d. j. 27/02/2013, d. p. 08/03/2013.)

RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE ANOTAÇÃO DA CTPS. Ainda que obrigatórias as anotações na CTPS, que se traduzem em uma obrigação imposta ao empregador imanada de norma de ordem pública e cogente prevista no artigo 29 da CLT, sua falta não implica, por presunção, dano moral ao empregado, que não se furta de comprovar o necessário prejuízo sofrido, o constrangimento ou reprovação social capaz de lhe assegurar a respectiva reparação. A consequência da ausência de anotação na CTPS impõe sua retificação, mediante determinação judicial. Recurso de revista conhecido e desprovido. (TST. RR - 147200-11.2007.5.01.0067, 6ª Turma, Relator: Aloysio Corrêa da Veiga, d. j. 14/04/2010, d. p. 23/04/2010).

DANO MORAL - AUSÊNCIA DE ANOTAÇÃO DA CTPS. Mesmo que necessárias as anotações na CTPS, sua falta não implica, presumidamente, dano moral ao empregado, que deve comprovar os requisitos da reparação civil (dano, culpa e nexo causal). Recurso de revista conhecido e desprovido. (TST. RR - 101900-77.2007.5.03.0032, 2ª Turma, Relator: Renato de Lacerda Paiva, d. j. 22/06/2011, d. p. 01/07/2011).

DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE REGISTRO EM CTPS E NÃO PAGAMENTO DE VERBAS RESCISÓRIAS. NÃO COMPROVAÇÃO DE SITUAÇÕES HUMILHANTES E VEXATÓRIAS. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. É certo que a conduta da reclamada é reprovável e merece censura. No entanto, também é certo que o período do contrato de trabalho, sem registro, já foi reconhecido (com determinação de registro em CTPS) e o inadimplemento de diferenças de verbas rescisórias já foi reparado com a determinação judicial de pagamento de referidas parcelas.
De todo modo, não houve a comprovação de que o autor sofreu situações humilhantes e vexatórias, valendo-se destacar que não foi ouvida uma testemunha sequer na presente reclamação, tendo o reclamante requerido o encerramento da instrução processual. Recurso ordinário obreiro não provido. (TRT15. RO – 0000224-86.2011.5.15.0105. 2ª Turma, Relatora: Ana Amarylis Vivacqua de Oliveira Gulla, d. j. 22/10/2013, d. p. 30/10/2013).

E a segunda corrente jurisprudencial sustenta que tal indenização seria devida tão somente pela inexistência de registro na CTPS, devido à presunção do prejuízo e pela impossibilidade de aferir quais os danos causados por essa omissão e a sua extensão.
Nesse sentido:

INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. AUSÊNCIA DE ANOTAÇÃO DO CONTRATO NA CTPS. O quadro descrito no acórdão regional permite concluir pela existência de dano moral, em face da inobservância, pelo empregador, do direito primordial do trabalhador de ter o seu contrato de trabalho anotado em carteira de trabalho e previdência social, que lhe possibilita o acesso aos benefícios assegurados somente àqueles formalmente registrados. Recurso de revista não conhecido. (TST. RR - 88200-50.2006.5.02.0047, 3ª Turma, Relator: Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, d. j. 11/12/2013, d. p. 13/12/2013).

"RECURSO DE REVISTA. DANO MORAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO DANO (alegação de violação dos artigos 1º, III e 5º, V e X da CF/88 e divergência jurisprudencial). O dano moral pode ser definido como lesão à -esfera personalíssima da pessoa- ou, para citar o Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, pode ser conceituado como -violação do direito à dignidade humana-. Há possibilidade de que ele se evidencie no -desprestígio-, -na desconsideração social-, -no descrédito à reputação- e -na humilhação pública- do indivíduo. Mas a existência do dano moral fica configurada quando ele é presumível, ou seja, quando, em face da ocorrência de determinado fato ofensivo, o sofrimento íntimo (dano/prejuízo moral) é esperado, provável, razoavelmente deduzido. Sendo assim, sua existência decorre de uma presunção hominis, é fruto da intuição de qualquer um que, exercitando a capacidade de empatia e munido de certa imaginação, tenta colocar-se no lugar daquele que foi ofendido em sua dignidade, para assim concluir pela possibilidade de sofrimento psíquico. Essa presunção acerca da existência (ou não) do dano moral, em razão de algum acontecimento danoso, somente é possível, porque os indivíduos, a par de todas as suas particularidades e idiossincrasias (que é o que os tornam indivíduos), partilham da mesma condição humana e, em última análise, quase sempre sofrem (em maior ou menor grau) pelos mesmos motivos. A 'prova' do dano moral, portanto, é a existência do próprio fato danoso - a partir do qual se presume sua existência. Recurso de revista conhecido e provido." (TST. RR-21400-53.2005.5.05.0027, 2ª Turma, Relator Ministro Renato de Lacerda Paiva, d. j. 28/03/2012, d. p. 13/04/2012).

DANO MORAL. FALTA DE ANOTAÇÃO NA CTPS. RECONHECIMENTO DA RELAÇÃO DE EMPREGO EM JUÍZO. Insurge-se a Reclamada contra o deferimento de indenização por danos morais decorrentes da ausência de registro em CTPS, sob o fundamento de que não restou demonstrado prejuízo de ordem moral, sendo controvertida a existência da relação trabalhista. Não há dúvida quanto à ilegalidade da conduta da Recorrente, até mesmo pelo reconhecimento da relação de empregado judicialmente. Resta saber se a sua atitude enseja o pagamento de indenização por danos morais. A carteira de trabalho - CTPS é documento de identificação pessoal e de total relevância para o exercício de qualquer emprego ou de atividade por conta própria, pois registra todo o histórico profissional do trabalhador e também garante o acesso a alguns dos principais direitos trabalhistas tais como seguro desemprego e benefícios previdenciários. Deste modo, a postura da Reclamada em ocultar a relação trabalhista viola o direito à honra e dignidade humana do trabalhador e da sua família, que sofre limitação na comprovação correta da sua vida funcional e, principalmente, no acesso a inúmeros direitos trabalhistas, essenciais na manutenção da sua vida e de seus dependentes. Em matéria de prova, o da no moral não é suscetível de comprovação, diante da impossibilidade de se fazer a demonstração, no processo judicial, da dor, do sofrimento e da angústia do trabalhador. Portanto, trata-se de "damnum in re ipsa", ou seja, o dano moral é decorrência do próprio fato ofensivo. Assim, comprovado o evento lesivo, tem-se como consequência lógica a configuração de dano moral, surgindo à obrigação do pagamento de indenização, nos termos do art. 5º, X, da Constituição Federal, diante da ofensa aos direitos da personalidade. Rejeito o apelo. (TRT02. RO-0002662-24.2012.5.02.0037, 14ª Turma, Relator Francisco Ferreira Jorge Neto, d. j. 07/11/2013, d. p. 18/11/2013).

DANO MORAL POR AUSÊNCIA DE REGISTRO. O trabalhador sem registro fica marginalizado do mercado. Não contribui para a previdência e não é incluído no FGTS e programas governamentais. Tem dificuldade de abrir ou manter conta bancária, obter referência, crédito etc, ficando em situação de permanente insegurança e desrespeito. Só o registro pela via judicial não é suficiente para reparar as lesões decorrentes dessa situação adversa, em que o trabalhador permanece sem registro, como "clandestino" em face do mercado de trabalho, à margem do aparato protetivo legal e previdenciário. In casu, sem identidade como trabalhador, o reclamante teve negada sua existência perante o mundo do trabalho. Durante toda a relação viu-se submetido a humilhante anonimato, negado pela empresa que lhe recusou a identificação funcional. A língua espanhola registra o verbo ningunear, na acepção de "aniquilar, tornar ninguém". A ausência deliberada do registro, apelidada de informalidade, é sinônimo de nulificação, negação não apenas de direitos básicos mas da própria pessoa do trabalhador, traduzindo-se em exclusão social. Devida a indenização por dano moral. (TRT02. RO-0033100-94.2010.5.02.0201, 4ª Turma, Relator Ricardo Arthur Costa e Trigueiros, d. j. 22/03/2011, d. p. 01/04/2011).

Tais jurisprudências tratam do dano moral in re ipsa, que não necessita de prova da ocorrência do dano concreto, mas apenas a demonstração da conduta ilícita, a partir da qual se verifica ofensa aos direitos da personalidade.
Sobre este tema, assim explana o autor Sérgio Cavalieri Filho:

Neste ponto a razão se coloca ao lado daqueles que entendem que o dano moral está ínsito na própria ofensa, decorre da gravidade do ilícito em si. Se a ofensa é grave e de repercussão, por si só justifica a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado. Em outras palavras, o dano moral existe in re ipsa; deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção natural, uma presunção hominis ou facti, que decorre das regras da experiência comum. Assim, por exemplo, provada a perda de um filho, do cônjuge, ou de outro ente querido, não há que se exigir a prova do sofrimento, porque isso decorre do próprio fato de acordo com as regras de experiência comum; provado que a vítima teve o seu nome aviltado, ou a sua imagem vilipendiada, nada mais ser-lhe-á exigido provar, por isso que o dano moral está in re ipsa; decorre inexoravelmente da gravidade do próprio fato ofensivo, de sorte que, provado o fato, provado está o dano moral.[3]

Portanto, a partir destes julgados, compreende-se que a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho e dos Tribunais Regionais do Trabalho ainda é dividida em relação à exigência da comprovação da ocorrência de dano efetivo com a ausência de registro na CPTS do empregado, além da conduta culposa do empregador e do nexo causal, para a sua condenação no pagamento de indenização por danos morais.
Observa-se também que não há controvérsia sobre a culpa do empregador nestes ou em outros acórdãos, tendo em vista que a conduta do empregador que se abstém de registrar o contrato de trabalho na CTPS do empregado se refere a um abuso de direito (Art. 187 do CC) de seu poder diretivo, devendo responder de forma objetiva.
Nesse sentido, sobre o artigo 187 do Código Civil vigente atualmente, assim explica o autor Sérgio Cavalieri Filho:

Depreende-se da redação desse artigo, em primeiro lugar, que a concepção adotada em relação ao abuso do direito é a objetiva, pois não é necessária a consciência de se excederem, com o seu exercício, os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou econômico do direito; basta que se excedam esses limites.[4]

Em sintonia a esta tese, assim é o teor do Enunciado n° 37, resultante das Jornadas de Direito Civil, realizadas pelo Conselho da Justiça Federal: “Art. 187: A responsabilidade civil decorrente do abuso do direito independe de culpa e fundamenta-se somente no critério objetivo-finalístico.”[5]
Assim, observa-se que, mesmo sendo a jurisprudência dividida em relação à necessidade de comprovação de dano efetivo para que haja a indenização pela ausência de registro do empregado, por outro lado observa-se que, nestes casos, não há necessidade de comprovação de culpa, pois tendo a empresa o conhecimento da obrigação de registrar os empregados, não haveria como se cogitar em necessidade de provar a culpa do empregador, que cometeu ato ilícito de forma consciente, sendo a sua responsabilidade, portanto, objetiva.


CONCLUSÃO


É indiscutível que o sentimento com a ausência de registro excede o mero incômodo do cotidiano, pois o trabalhador se vê a margem da sociedade, desamparado pela previdência social, em casos de acidentes ou até em uma futura aposentadoria, sem a possibilidade de obter crédito do sistema financeiro, sem poder contar com o FGTS e Seguro Desemprego quando dispensado, dentre outras situações ofensivas a sua honra e imagem, além de outras consequências que futuramente poderiam prejudicar o obreiro.
E essa situação causa ao trabalhador, diariamente, um sofrimento que o atinge em sua imagem, honra e intimidade, o que no âmbito jurídico considera-se como dano moral, por haver agressão aos seus direitos fundamentais e à sua dignidade humana, sendo perfeitamente possível a condenação da empresa no pagamento de indenização pelo dano moral causado pela ausência de registro no CTPS do trabalhador.
Há apenas divergência, como discorrido oportunamente, sobre a obrigatoriedade da comprovação do dano efetivo.
Parte da jurisprudência defende que é necessária a comprovação de dano, como, por exemplo, a impossibilidade de recebimento de benefício previdenciário quando acidentado, dentre outras hipóteses concretas.
Em sentido diverso, outro segmento jurisprudencial defende ser cabível a indenização por dano moral decorrente da ausência de registro do contrato de trabalho tão somente pela ocorrência da conduta ilícita. Esta corrente sustenta que a conduta do empregador que não registra o empregado configura-se como ato ilícito notoriamente ofensivo ao trabalhador, causando um dano in re ipsa, que pode ser constatado pela mera ocorrência da conduta ilícita, pela gravidade da conduta ou por ser impossível a prova.
Vislumbramos ser mais adequada à efetividade dos direitos sociais e fundamentais do trabalhador esta última corrente jurisprudencial, uma vez que não há como se exigir a comprovação de um dano palpável, porque o dano moral, nestes casos, se configura in re ipsa, por conta da gravidade da conduta e por ser impossível a demonstração de danos e consequências concretas, principalmente pela impossibilidade de provar a negativa de direitos em decorrência de ausência de registro em CTPS, o preconceito que o trabalhador informal sofre perante a sociedade, a insegurança jurídica, dentre outras ofensas à imagem e honra do trabalhador, causadas por esta espécie de conduta. Na maioria das vezes o prejuízo decorrente da ausência de registro em CTPS não é documentado nem testemunhado.
E, como visto, também não há necessidade de comprovação de culpa do empregador, sendo impossível sustentar-se em sua defesa a ausência de culpabilidade pela falta de registro, pois esta conduta constitui um abuso de seu direito ao poder diretivo, cuja responsabilidade dele decorrente é objetiva.
Assim, mostra-se juridicamente possível e socialmente relevante a condenação da empresa no pagamento de indenização pelo dano moral, quando deixa de registrar a CTPS do empregado, devendo ser responsabilizada independentemente de comprovação de sua culpa e de prova do dano, a qual, se fosse exigida, tornaria inalcançável a devida reparação civil na hipótese estudada.
Aliás, a indenização pelo dano moral nestas situações teria funções extremamente importantes às relações sociais, tendo em vista que, além de reparar o dano causado ao empregado, desmotivar a reiteração de condutas da empresa ofensora e de outras, também seria um incentivo à formalização de contratos de trabalho, que atualmente está longe de abranger todos os empregados do país, o que também resultaria em maior arrecadação de contribuições sociais, sem contar, ainda, que haveria maior efetividade dos direitos sociais e fundamentais do trabalhador, que são colocados em risco também no momento em que se ofende a sua identidade profissional, com a ausência de registro do contrato de trabalho.

REFERÊNCIAS

CARRION, Valentim. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. 37ª. ed. atual. por Eduardo Carrion. São Paulo: Ed. Saraiva, 2012.

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2012.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 13. ed. São Paulo: LTr, 2014.

GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Manual de direito do trabalho. 7. ed. rev. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

JORNADAS de direito civil I, III, IV e V: enunciados aprovados. Conselho da Justiça Federal. Brasília, DF. Disponível em: <http://www.cjf.jus.br/CEJ-Coedi/jornadas-cej/enunciados-aprovados-da-i-iii-iv-e-v-jornada-de-direito-civil/compilacaoenunciadosaprovados1-3-4jornadadircivilnum.pdf>. Acesso em 23 ago. 2015.




* Evandro de Oliveira Tinti é Advogado e Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela Escola Paulista de Direito – EPD.
[1] GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 670.
[2] Ibid., p. 699.
[3] CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 97.
[4] CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 173.
[5] JORNADAS de direito civil I, III, IV e V: enunciados aprovados. Conselho da Justiça Federal. Brasília, DF. Disponível em: <http://www.cjf.jus.br/CEJ-Coedi/jornadas-cej/enunciados-aprovados-da-i-iii-iv-e-v-jornada-de-direito-civil/compilacaoenunciadosaprovados1-3-4jornadadircivilnum.pdf>. Acesso em 23 ago. 2015.


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Publicado na Revista LTr - Suplemento Trabalhista em outubro/2015.

COMO REFERENCIAR: TINTI, Evandro de Oliveira. Responsabilidade civil do empregador pela ausência de registro do contrato de trabalho . LTr Suplemento Trabalhista. São Paulo, v. 51, n. 121, p. 625-630, outubro, 2015.

domingo, 27 de novembro de 2016

ARTIGO - O que são Convenções e Acordos Coletivos de Trabalho?


Convenção Coletiva de Trabalho é um acordo realizado entre um ou mais sindicatos de empregados e um ou mais sindicatos de empregadores, tratando de condições de trabalho daquela categoria de empregados, na abrangência territorial dos sindicatos participantes.

Já o Acordo Coletivo de Trabalho resulta da negociação entre o sindicato dos trabalhadores diretamente com uma ou mais empresas de uma categoria econômica, igualmente para tratar de condições laborais dos empregados, mas com abrangência apenas para os empregados das empresas participantes.

A diferença básica entre eles está nas partes negociantes, pois na Convenção temos apenas sindicatos em negociação, enquanto que no Acordo, o sindicato dos trabalhadores trata apenas com uma ou mais empresas, e não com sindicatos. 

Ambos tem a finalidade de criar regras e direitos específicos para os trabalhadores de sua abrangência, observando os detalhes e peculiaridades daquela categoria profissional, pois nem sempre a lei consegue tratar dos problemas específicos.

O intuito dos Acordos e Convenções Coletivos de Trabalho é a criação de normas mais benéficas aos empregados, pois o que está previsto em Lei não pode ser reduzido. Se estas normas trouxerem direitos menores que os previstos em Lei, simplesmente não será aplicável.

No entanto, há algumas exceções onde se permite a relativização de um direito, mas sempre com a compensação equivalente ou mais benéfica.

Claro que são exceções, que devem ser vistas com cuidado pelo sindicato quando de negociar e pelo juiz do trabalho no momento de analisar o caso, para que não haja reduções de direitos trabalhistas conquistados ao longo de décadas.

Enfim, pode-se dizer que as Convenções e os Acordos Coletivos de Trabalho são importantes instrumentos dos trabalhadores para melhoria de suas condições de trabalho, aprimorando-se as regras aplicáveis no âmbito daquela categoria profissional, que quanto mais unida mais direitos e garantias básicas obterá.

quarta-feira, 12 de outubro de 2016

DICA DE LIVRO - Germinal - Émile Zola


Boa tarde caros leitores, vamos à mais uma indicação de livro, desta vez com um livro que tem referência direta com a situação dos trabalhadores assalariados modernos, chamado Germinal, que foi publicado em 1885.

Este livro, escrito por Émile Zola, é uma das obras mais relevantes do gênero literário denominado naturalismo, especialmente por se basear em fatos verídicos.

Em resumo, o livro trata da situação dos trabalhadores em uma mina de carvão na França, no século XIX, e as consequências que a sua realidade precária exerce em sua vida social, sua individualidade, seus relacionamentos e até mesmo sua saúde, além de demonstrar a importância da união dos trabalhadores em prol de interesses comuns.

Claro que a conjuntura descrita pelo autor se estende à situação de trabalhadores por todo o mundo e ao longo de várias épocas, inclusive atualmente, com algumas alterações, sendo muito importante a sua leitura para formação de reflexões sobre as relações de trabalho modernas.

O que contribuiu para a riqueza de detalhes do livro foi a experiência que o autor passou ao trabalhar em uma mina de carvão por cerca de dois meses, com o propósito de entender a realidade dos trabalhadores.

A Obra é de domínio público, e está disponível na internet.


BOA LEITURA!!!

Dia das Crianças








QUE TODOS LUTEM POR UM FUTURO ONDE AS PESSOAS TENHAM OPORTUNIDADE DE EFETIVAMENTE APROVEITAR CADA FASE DE SUA VIDA, ESPECIALMENTE A INFÂNCIA E A ADOLESCÊNCIA, LIVRE DE QUALQUER EXPLORAÇÃO OU OPRESSÃO!!!


FELIZ DIA DAS CRIANÇAS!!!


domingo, 2 de outubro de 2016

DICA DE LIVRO - As doenças dos trabalhadores - Bernardino Ramazzini


Olá caro leitor, pretendo começar a postar aqui no blog, sempre que possível, indicações de livros jurídicos ou não jurídicos, que possam ser de interesse dos leitores.

O primeiro livro é intitulado “As doenças dos trabalhadores” (no original, "De Morbis Artificum Diatriba"), e foi escrito no ano de 1700, por Bernardino Ramazzini, médico italiano, que até atualmente é considerado o pai da medicina do trabalho.

Isso porque este livro foi precursor da medicina do trabalho, voltada ao estudo da saúde e higiene dos trabalhadores, fazendo o autor uma análise minuciosa das doenças relacionadas às profissões que pesquisou.

Para escrever este livro o autor passou diversos meses acompanhando trabalhadores das mais diversas profissões, mais de cinqüenta, tais como os mineiros, os químicos, os ferreiros, os vidraceiros (no caso, os fabricantes de vidros e espelhos), os pintores, dentre outros, e também uniu suas analises ao conhecimento médico da época, para tecer diversas conclusões sobre doenças específicas decorrentes do exercício daquelas profissões, criando uma verdadeira enciclopédia sobre o tema.

O autor vai além e, no prefácio, diz que o médico, dentre as perguntas básicas que faz a um paciente para chegar ao diagnóstico deveria incluir uma pergunta essencial, que seria “que arte exerce?”, no sentido de qual profissão o paciente exerce, pois isso diria muito sobre seus sintomas e doenças.

Concluindo, embora o livro não seja jurídico, e não traga os conhecimentos científicos mais modernos em medicina do trabalho, ainda assim há certas análises e comentários do autor que se mantém atualizadas, e acima de tudo demonstra a importância cada vez mais crescente da matéria Saúde, Medicina, Higiene e Segurança do Trabalho no Brasil e no mundo.

Lebrando apenas que a FUNDACENTRO disponibiliza este livro em “pdf” neste link:


Aproveitem!!!
Boa leitura!!

terça-feira, 27 de setembro de 2016

ARTIGO - O que é insalubridade e periculosidade?


Os termos insalubridade e periculosidade são utilizados com frequência no dia a dia dos trabalhadores, mas nem todos conhecem as diferenças e semelhanças básicas entre ambos, nem os seus direitos quando trabalham nestas condições.
O trabalho insalubre é aquele em que o empregado é exposto a agentes que podem lhe causar prejuízos à saúde se excedidos os limites e regras definidas pelo Ministério do Trabalho por meio de Normas Regulamentadoras.
Pode causar, a propósito, um prejuízo à saúde ou à integridade física a médio e longo prazo, conforme a exposição ao ambiente insalubre.
Já o trabalho perigoso é aquele realizado diante de riscos de acidentes graves, como explosões, choques, dentre outros.
Por isso, a Consolidação das Leis do Trabalho apresenta, em seu artigo 193, um rol dos trabalhadores que se enquadram no conceito de periculosidade, que são: os vigilantes patrimoniais, os eletricistas, os que trabalham com inflamáveis e explosivos, e também do trabalhador externo que atua com motocicleta, conhecidos por “motoboys”. Há também periculosidade a quem trabalha exposto a radiação ionizante ou substância radioativa.
Algumas pessoas confundem a periculosidade aqui explicada com os riscos de outras atividades. Na verdade toda atividade tem seus perigos, mas o adicional de periculosidade é devido apenas nas hipóteses definidas em lei, citadas anteriormente.
Conforme o artigo 192 da CLT, para o empregado que trabalha em atividade insalubre é devido adicional de 10%, 20% ou 40% sobre o salário mínimo nacional, de acordo com o grau de insalubridade, definido também pelo Ministério do Trabalho.
E ao trabalhador em atividade perigosa, é devido adicional de 30% sobre o seu salário (art. 193, §1°, da CLT).
É possível notar que no caso da insalubridade há três adicionais diferentes, de acordo com a gravidade da situação, e o percentual é sobre o salário mínimo nacional. Já no caso da periculosidade o percentual é único, 30%, é calculado sobre o salário do empregado.
Outra observação importante é que apenas no caso de insalubridade é possível a neutralização dos riscos com Equipamentos de Proteção Individual, como luvas, botas, roupas especiais, etc., que devem ser registrados no Ministério do Trabalho, e servem para amenizar os efeitos dos riscos.
Mas claro que no caso de trabalho perigoso também é importante a utilização de Equipamentos de Proteção Individual, pois embora não haja neutralização do risco, há uma grande redução de chances de acidentes, o que nem por isso retira o direito ao adicional. Podemos citar como exemplo os eletricistas, que devem receber luvas de borracha e outros EPIs que podem evitar choques elétricos.
E os adicionais são devidos mesmo quando não se trabalha no ambiente insalubre ou perigoso durante toda a jornada, mas de forma intermitente (Súmulas 47 e 364 do TST). Aliás, apenas não são devidos estes adicionais se a exposição for eventual, rara e imprevisível.
Ambos os adicionais podem ser retirados quando não houver mais exposição a agentes perigosos ou insalubres, pois a intenção da Lei é pressionar a empresa a melhorar o ambiente de trabalho, eliminando ou neutralizando os riscos aos trabalhadores, ficando autorizada a retirar o adicional ao cumprir esta obrigação (art. 194 da CLT).
Por fim, importante mencionar que o artigo 195 da CLT determina a obrigatoriedade de realização e perícia para a caracterização da insalubridade ou da periculosidade.

NOTÍCIA - Vigilante receberá horas extras por curso de reciclagem feito nos dias de folga

  
A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a VSG – Vigilância e Segurança em Geral Ltda. a remunerar como horas extras o tempo gasto por um vigilante patrimonial com curso de reciclagem obrigatório feito nos dias de folga. A decisão teve fundamento na jurisprudência do TST no sentido de que o período dos cursos obrigatórios realizados fora da jornada normal de trabalho tem de ser pago como serviço extraordinário, pois representa tempo à disposição do empregador.

Na ação judicial, o vigilante relatou que participava de uma capacitação por ano, e pediu o pagamento das horas por acreditar ser a empresa a única beneficiária da atividade de aperfeiçoamento profissional. Por outro lado, a VGS afirmou que a reciclagem ocorria a cada dois anos, por cerca de 4h, e apresentou convenções coletivas da categoria que excluíam do cálculo da jornada extra o período no qual o trabalhador participava do curso.

O juízo da 2ª Vara do Trabalho de Vitória (ES) julgou improcedente o pedido. A sentença esclareceu que a reciclagem está prevista para ocorrer a cada biênio, nos termos do artigo 32, parágrafo 8º, alínea "e", do Decreto 1.592/1995. Como o curso de capacitação é requisito para o exercício da profissão e o funcionamento da empresa, o juiz entendeu que tanto o vigilante quanto a VGS têm de contribuir para o treinamento – o empregador com o custeio das aulas, e o empregado com a disponibilidade de tempo, inclusive durante as folgas. A decisão foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (ES).

TST

O relator do recurso do vigilante ao TST, ministro João Oreste Dalazen, aplicou ao caso o artigo 4º da CLT, que considera como de atividade efetiva o tempo em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial devidamente registrada.

A decisão foi unânime.


Fonte: TST

quinta-feira, 9 de junho de 2016

ARTIGO - O que é rescisão indireta do contrato de emprego?

O contrato de emprego, também chamado de contrato de trabalho, encontra diversas formas de rescisão, seja pelo empregado, seja pelo empregador.

As formas mais comuns de encerramento de um vínculo de emprego são a dispensa sem justa causa, a dispensa por justa causa e o pedido de demissão.

Na dispensa sem justa causa, por ser iniciativa da empresa, sem culpa nenhuma do empregado, é direito do trabalhador receber diversas verbas rescisórias, como férias proporcionais e vencidas, décimo terceiro salário proporcional, saldo de salário (que é o salário proporcional aos dias trabalhados no último mês), além do aviso prévio (seja trabalhado ou indenizado) e da multa de 40% sobre todo o valor depositado de FGTS, como formas de punição à empresa que surpreendeu o empregado ao dispensá-lo sem motivos.

Também é permitido ao empregado, nesse caso, o saque dos depósitos de FGTS e, se atendidos os requisitos legais, o recebimento do Seguro Desemprego.

A dispensa por justa causa e o pedido de demissão provém de um ato do empregado, no primeiro caso quando o trabalhador descumpre seus deveres no trabalho, e no segundo caso quando ele não deseja mais continuar trabalhando e toma iniciativa da rescisão.

Na dispensa por justa causa o empregado tem direito a apenas ao aviso prévio e às férias vencidas e proporcionais, e no caso do pedido de demissão tem direito ao aviso prévio, 13° salário proporcional e férias vencidas e proporcionais.

E em nenhum dos dois casos o empregado consegue sacar o FGTS ou receber o seguro desemprego.

No entanto, poucos empregados sabem que também existe a justa causa do empregador, que a lei chama de rescisão indireta do contrato de trabalho, uma vez que ambas as partes do contrato tem seus direitos e deveres a cumprir.

Por isso, se o empregador deixar de pagar salários, ou atrasar, deixar de depositar o FGTS, ofender o empregado, dentre outros descumprimentos de suas obrigações de empregador, o empregado poderá propor uma Reclamação Trabalhista pleiteando o reconhecimento da rescisão indireta, hipótese em que terá direito a todas as verbas de quando se é dispensado sem justa causa.

Até mesmo o FGTS e o Seguro desemprego são direitos no caso da rescisão indireta.

O que ocorre na prática é que muitas vezes o empregado, diante destes descumprimentos contratuais por parte do empregador, acaba pedindo demissão, como se espontaneamente tivesse desejando deixar o emprego, quando na verdade tinha o direito de pleitear a rescisão indireta do contrato.

Claro que, mesmo se houve o pedido de demissão, o empregado ainda tem possibilidade de conseguir na Justiça do Trabalho a reversão deste pedido, para rescisão indireta, se comprovar que só pediu demissão diante das faltas graves cometidas pelo empregador, passando a ter direito a todas as verbas rescisórias que receberia se fosse dispensado sem justa causa.


Por isso, é importante que o empregado tenha consciência de seus deveres e direitos, para que saiba como agir em situações delicadas como esta, nunca deixando, aliás, de procurar seu advogado de confiança para melhores esclarecimentos quanto a seu caso específico. 


Evandro de Oliveira Tinti
Advogado e Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela EPD - Escola Paulista de Direito

(Artigo Publicado no jornal O Regional em 21/05/2016)

quinta-feira, 2 de junho de 2016

NOTÍCIA - TST edita três novas súmulas e altera mais itens da jurisprudência para adequá-la ao novo CPC.


O Pleno do Tribunal Superior do Trabalho aprovou, na segunda-feira (30/5), a Resolução 209/2016, que edita três novas súmulas e altera diversos outros itens de sua jurisprudência. Os novos verbetes tratam de ônus da prova para obtenção de vale-transporte e da regularidade do depósito do FGTS e da incidência de multas em caso de reconhecimento de vínculo por decisão judicial.

As alterações de súmulas e orientações jurisprudenciais decorrem da necessidade de adequação ao novo Código de Processo Civil, que entrou em vigor em março deste ano.

Novas súmulas

Súmula 460. Vale-transporte. Ônus da prova.

É do empregador o ônus de comprovar que o empregado não satisfaz os requisitos indispensáveis para a concessão do vale-transporte ou não pretenda fazer uso do benefício.

Súmula 461. FGTS. Diferenças. Recolhimento. Ônus da prova.

É do empregador o ônus da prova em relação à regularidade dos depósitos do FGTS, pois o pagamento é fato extintivo do direito do autor (art. 373, II, do CPC de 2015).

Súmula 462. Multa do art. 477, § 8º, da CLT. Incidência. Reconhecimento judicial da relação de emprego.

A circunstância de a relação de emprego ter sido reconhecida apenas em juízo não tem o condão de afastar a incidência da multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT. A referida multa não será devida apenas quando, comprovadamente, o empregado der causa à mora no pagamento das verbas rescisórias.


Fonte: TST