O Pleno do
Tribunal Superior do Trabalho decidiu, em sessão realizada nesta terça-feira
(4/8), que os créditos trabalhistas devem ser atualizados com base na variação
do Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O índice será utilizado pelo
Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) para a tabela de atualização
monetária da Justiça do Trabalho (Tabela Única).
A decisão
foi tomada no julgamento de arguição de inconstitucionalidade suscitada pelo
ministro Cláudio Brandão em relação a dispositivo da Lei da Desindexação da
Economia (Lei 8.177/91) que determinava a atualização dos valores devidos na
Justiça do Trabalho pela Taxa Referencial Diária (TRD). Por unanimidade, o
Pleno declarou a inconstitucionalidade da expressão "equivalentes à
TRD", contida no caput do artigo 39 da lei, e deu interpretação
conforme a Constituição Federal para o restante do dispositivo, a fim de
preservar o direito à atualização monetária dos créditos trabalhistas.
Recomposição
Em seu
voto, o ministro observou que o Supremo Tribunal Federal (STF), em quatro ações
diretas de inconstitucionalidade (ADIs 4357, 4372, 4400 e 4425), declarou
inconstitucional a expressão "índice oficial da remuneração básica da
caderneta de poupança", do parágrafo 12 do artigo 100 da Constituição
Federal, e afastou a aplicação da Taxa Referencial (TR). Segundo o STF, a
atualização monetária dos créditos é direito do credor e deve refletir a exata
recomposição do poder aquisitivo decorrente da inflação do período, sob pena de
violar o direito fundamental de propriedade, a coisa julgada e o postulado da
proporcionalidade, além da eficácia e efetividade do título judicial e a
vedação ao enriquecimento ilícito do devedor.
"Diante
desse panorama, é inevitável reconhecer que a expressão ‘equivalentes à TRD'
também é inconstitucional, pois impede que se restabeleça o direito à
recomposição integral do crédito reconhecido pela sentença transitada em
julgado", afirmou o relator. Esse desdobramento é chamado "declaração
de inconstitucionalidade por arrastamento" (ou por atração, consequência, etc.),
que ocorre quando a declaração de inconstitucionalidade de uma norma se estende
a outros dispositivos conexos ou interdependentes.
Brandão
destacou a necessidade de se reparar a defasagem do índice de correção.
"Ao permanecer essa regra, a cada dia o trabalhador amargará perdas
crescentes resultantes da utilização de índice de atualização monetária que não
reflete a variação da taxa inflacionária", afirmou, ressaltando que a TRD,
em 2013, foi de 0,2897%, enquanto o IPCA foi de 5,91%.
Interpretação conforme
A declaração
da inconstitucionalidade deu origem a novo debate jurídico, visando definir o
índice a ser aplicável. Para evitar um "vazio normativo", o Pleno
decidiu adotar a técnica de interpretação conforme a Constituição para o
restante do caput do artigo 39 da Lei 8.177/91, que garante a
atualização monetária dos créditos trabalhistas, extinguindo apenas a expressão
considerada contrária Constituição e assegurando o direito ao índice que
reflita a variação integral da inflação, dentre os diversos existentes (IPC, IGP,
IGP-M, ICV, INPC e IPCA, por exemplo).
Aqui, mais
uma vez, a escolha do IPCA-E segue precedente do STF, que, em medida cautelar
na Ação Cautelar 3764, adotou esse índice para a correção dos valores de
precatórios e requisições de pequeno valor (RPV) da União. O voto do relator
lembra ainda que o IPCA-E vem sendo utilizado em decisões administrativas do
TST e do STF.
A medida
corrige o que o ministro Cláudio Brandão definiu como um "interessante
efeito colateral", na área trabalhista, da decisão do STF sobre a correção
dos precatórios pelo IPCA-E. Desde então, segundo o relator, "passou a
existir estranho e injustificável desequilíbrio entre os titulares de créditos
trabalhistas": os credores de entidades públicas, que recebem por meio de
precatórios, têm seus créditos corrigidos pelo novo índice, enquanto os
créditos de devedores privados continuaram a ser atualizados pela TR.
Modulação
Os
ministros também modularam os efeitos da decisão, que deverão prevalecer a
partir de 30 de junho de 2009, data em que entrou em vigor o dispositivo
declarado inconstitucional pelo STF (artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, introduzido
pela Lei 11.960/2009). A fim de resguardar o ato jurídico perfeito, a mudança
do índice, porém, não se aplica às situações jurídicas consolidadas,
resultantes de pagamentos efetuados nos processos judiciais que resultaram no
cumprimento da obrigação. "São atos já consumados segundo a lei vigente ao
tempo em que praticados", explicou Brandão.
A
modulação, portanto, vale apenas para os processos em curso, em que o crédito
ainda esteja em aberto, nos quais, segundo o relator, "não há direito a
ser resguardado, no mínimo pela recalcitrância do devedor em cumprir as
obrigações resultantes do contrato de trabalho e, mais, por não haver ato
jurídico concluído que mereça proteção".
A decisão
quanto à inconstitucionalidade foi unânime. Na parte relativa à modulação,
ficou vencida a ministra Dora Maria da Costa, que propunha a modulação a partir
de março de 2015. Ressalvaram o entendimento os ministros Guilherme Augusto
Caputo Bastos, Alexandre de Souza Agra Belmonte e Maria Helena Mallmann.
Processo
O caso que
suscitou a arguição de inconstitucionalidade foi um recurso em ação trabalhista
na qual uma agente comunitária de saúde do Município de Gravataí (RS) obteve o
reconhecimento do direito ao adicional de insalubridade. Na fase de execução, o
Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região determinou a correção do valor a ser
pago pelo município de acordo com o INPC apenas a partir de 2013. A agente
pretendia a aplicação do INPC por todo o período, e o município pedia a
atualização pela TR até que o STF defina a modulação dos efeitos da decisão que
afastou sua aplicação.
O ministro
Cláudio Brandão acolheu o recurso da agente e propôs a correção pelo IPCA-E.
Como a decisão implicaria a declaração da inconstitucionalidade de dispositivo
legal, o processo foi remetido ao Pleno, como prevê o Regimento Interno do
TST (artigo 245, parágrafo 3º).
O acórdão
será encaminhado à Comissão de Jurisprudência e de Precedentes Normativos do
TST para emissão de parecer sobre a Orientação Jurisprudencial 300 da
Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1).
Fonte: TST